Futebol Interativo

24/01/25 | Leitura 4min

A culpa é do analista?

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A culpa é do analista?


Por Marcus Arboés

Já aconteceu de seu time contratar um jogador que acaba não indo bem, ou até mesmo já é contestado antes da negociação e você notar os torcedores colocando a culpa da contratação no departamento de scout do clube? Vamos desmistificar e refletir mais sobre qual o papel do analista numa contratação.

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Com a dinâmica acelerada das redes sociais, é muito comum que os torcedores exerçam seus papéis críticos em relação às ações tomadas pelo clube em diferentes eventos e instâncias. Isso sempre existiu, mas é comum, também, que as cobranças e exigências acabem passando do tom e, principalmente, por falta de conhecimento de como o trabalho é realizado dentro de um clube profissional de futebol, acabam direcionando responsabilidade de forma equivocada e injusta.

Desde que a função de analista de mercado e scout chegou ao domínio público e ao conhecimento de senso comum, esses personagens têm sido vítimas de ataques exagerados ou até mesmo de críticas construtivas saudáveis que não necessariamente lhe cabem, devido a contratações que não agradam a massa de forma geral.

Apesar de ser só mais uma discussão que vai em volta em diferentes núcleos virtuais de torcida, discussões e explicações sobre o tema precisam existir porque há uma problemática a ser tratada, principalmente quando a situação fica pessoalizada. Um exemplo que ilustra isso é o de um perfil de análises no twitter ter decidido fazer um fio (conteúdo de tweets em sequência) falando todos os problemas - de forma errônea - do departamento de análise do Vasco, expondo nomes e rostos e "jogando para a torcida" a partir de uma posição de especialista no assunto.

É muito comum, não só em torcidas, como na mídia, e nem só no futebol, que as pessoas envolvidas na comunidade procurem bodes expiatórios para explicar algo que gera um desagrado e não está no seu domínio, no seu conhecimento ou no seu controle. É dessa forma que, além de culpabilizar dirigentes, tem se criado uma tendência de fazer ataques pessoais a analistas, scouts, olheiros e outros profissionais do clube envolvidos no processo de captação e contratação.

E, assim como esse caso do perfil de análises do Vasco, é muito comum que a análise acabe se enviesando pelas expectativas e fantasias de como os processos realmente funcionam dentro do clube e venha de mãos dadas com a falta de conhecimento sobre a profissão do analista/scout.

Por isso, neste artigo, a ideia é tentar desmistificar essas crenças em volta das funções.

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Como funciona o scouting?

Dentro do departamento de análise de um clube, há diferentes funções que podem ser exercidas por uma ou mais pessoas, a depender da estrutura do clube. Em equipes de médio porte, já é possível vermos uma estrutura maior, onde pelo menos uma pessoa fica responsável pela ala do scouting voltado ao recrutamento, ou seja, o processo de mapeamento, observação e avaliação de um jogador que pode vir a ser contratado pela equipe em que o analista trabalha. Outros profissionais serão responsáveis pela ala do desempenho, produzindo análises coletivas e individuais dos adversários e da própria equipe, mas o foco deste artigo é entendermos o papel do analista na contratação de um jogador.

O jogador a ser buscado no mercado, precisa se adequar a alguma necessidade do elenco, além de se encaixar no perfil de relação da equipe e, claro, no perfil orçamentário. Por isso, antes de qualquer monitoramento, é traçado, pela diretoria ou pela comissão técnica, um tipo de característica adequada. Num exemplo recente, Mano Menezes explicou que o Fluminense estava buscando pontas de velocidade e desmarque e jogadores de meio mais resistentes e intensos, para lidar com as fragilidades escolhidas e com o potencial de passes em infiltrações ao ter Paulo Henrique Ganso no meio de campo. Além disso, em trabalhos mais minuciosos, há uma lista de indicadores de desempenho e características e comportamentos em diferentes fases do jogo que são consideradas, além de performance, energia e outros quesitos físicos, psicológicos e táticos.

No futebol, entre muitas aspas, "ideal", é assim que se trabalha, mas precisamos ser realistas de que nem todo clube vai ter estrutura para ter uma rede de observação ultra qualificada, tanto em material humano quanto em tecnologia. Por isso, é importante que o profissional da análise de mercado entenda bem de características técnicas e táticas individuais e coletivas, para ter uma compreensão do modelo de jogo e dos princípios de jogo exigidos no grupo pela comissão e pelo treinador.

Essa observação, pode ser feita de diversas maneiras diferentes e com diferentes metodologias.

A pesquisa pode ser feita presencialmente, geralmente em competições de base, onde olheiros, dirigentes e membros da comissão técnica viajam para ver as partidas de um ou mais jogadores alvo, já que não há tanta filmagem disponível dessas partidas. Hoje, com o avanço tecnológico, já é muito mais comum que a observação seja realizada virtualmente. Nesse ponto, há várias empresas que prestam um serviço para observação de atletas, como o Wyscout e a SportsBase. Quando não acessíveis nessas plataformas, que são mais apropriadas e melhor direcionadas, jogos gravados no youtube ou em outros espaços digitais acabam "quebrando o galho", ou até com filmagens feitas por um olheiro ou conhecido no local de jogo desse atleta pesquisado.

Metodologicamente, o scouting de jogadores pode ser feito de forma assistemática, ou seja, mais espontânea e sem depender de uma técnica ou tecnologia específica, por exemplo, quando um olheiro assiste um campeonato de base de cidades do interior sem um alvo em específico; a metodologia sistemática, por sua vez, requer um processo de planejamento maior, equipamentos e softwares para auxiliar o trabalho e, como já dito, uma dedicação e seriedade maior ao assistir as partidas.

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De quais formas um jogador é contratado?

Agora que entendemos como funciona o trabalho do analista dentro da contratação, é importante termos noção das várias diferentes formas pelas quais um jogador chega em um time. Sendo realista e não idealista, muitas vezes, o analista sequer fez parte do processo.

Em alguns processos, é comum que o nome sequer passe pelo departamento de análise, como no processo que, muitas vezes, acontece em contextos de estadual ou Série D, de um treinador levar parte do seu elenco já conhecido pelo clube, o que facilita a adaptação tática a curto prazo, além de acelerar o processo de estruturação de relações.

  1. Indicação ou solicitação de análise do treinador;
  2. Indicação ou solicitação de análise de dirigente do clube;
  3. Indicação de empresário ligado ao clube;
  4. Indicação de olheiro ou de analistas freelancers;
  5. Através de dados, o nome é listado para observação e indicado pelo scouting;
  6. O departamento de análise encontra o jogador por um meio diferente, analisa e indica;
  7. Ao enfrentar uma equipe, o nome de um jogador é listado e entra no radar do scouting;

Há incontáveis outras formas, até menos criteriosas e mais questionáveis, de um atleta ser contratado, mas o mais importante é entender que, quando e se passar pelo analista, nem sempre o fato dele avaliar bem ou mal será considerado na hora da contratação e que a maneira como o nome desse atleta chega ao departamento de análise quase nunca estará no domínio público ou da mídia.

É muito comum críticos da mídia ou torcedores nas redes sociais protestarem contra negociações e falarem da "falta de criatividade" da análise de mercado dos clubes, sem ter a mínima noção se, realmente, os analistas/scouts daquela equipe realmente tiveram algum papel na contratação. Geralmente, a grande maioria dos nomes indicados pelo scouting não são contratados por diversos fatores diferentes, afinal, o trabalho de montagem de elenco é muito complexo. E, para além disso, mesmo que tenham indicado e que o jogador tenha ido mal, isso não diz necessariamente que o scouting errou, mas esse jogador pode não ter se adaptado por diversos fatores.

Depois de ler isso, você ainda acha que aquela contratação ruim do seu time é realmente culpa do analista?


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